Brasil 2002 (15/12/72)

Tal é o título do livro em que Mário Henrique Simonsen condensou uma série de estudos sobre vários problemas nacionais da maior atualidade. O título foi escolhido por motivos cronológicos mais do que referentes ao precioso e diversificado conteúdo. O 2002 é suposto ser a continuação do 2001, o qual assim se denominara pelas críticas e comentários ao célebre Brasil 2000 de Kahn e Winer. No novo 2002 de Simonsen, as vicissitudes da futurologia (que são muitas) ocupam apenas o primeiro capítulo, em que o autor começa dizendo que “o futurólogo é uma espécie de cartomante recheado de álgebras, procurando satisfazer uma das maiores angústias da humanidade, o pré-conhecimento do futuro”.

 

O relato das vicissitudes ou, antes, a critica do pessimismo, começa pela teoria clássica inglesa de Malthus, Ricardo e outros, que se esqueceram de que a lei fatalística dos rendimentos decrescentes podia ser contornada pelo acúmulo de capital e pelo progresso tecnológico; segue pela errologia; mais diversificada, de Marx, a começar pela falsa teoria da mais-valia e pela omissão de que a maximização do lucro, objetivo do capitalismo, não importa na necessidade de minimizar o emprego e os salários.

 

Simonsen diz muito bem que determinismo cientifico, como base prática de previsões só na astronomia... até que os homens aprendam a mudar a trajetória dos astros...

 

Falando do milagre brasileiro, adverte o autor – tomem bem nota – que: “Qualquer quebra do racionalismo em termos de um romantismo distributivista ou de um nacionalismo xenófobo poderia comprometer seriamente o atual sistema de confiança sobre o qual se está construindo o milagre brasileiro” E conclui o presidente do Mobral que: “O mais importante é preparar novas gerações que sejam capazes de perpetuar as altas taxas de crescimento dos últimos anos”.

 

Estendendo seus comentários, Simonsen discorre resumidamente sobre o milagre paralelo ou, antes sobre a explosão demográfica, a meu ver uma das mais graves omissões do governo Médice.

 

Preliminarmente diz o autor que, “quando um casal se enlaça em um ato amoroso, nada indica que a intenção seja de produzir um filho”, e observa que “o excesso de crescimento populacional costuma gerar sérios problemas de emprego e de distribuição de renda”, e que “a planificação familiar é um direito exercido pelos ricos e sonegado à classes mais pobres”.

 

Referindo-se ao ingênuo argumento da ocupação da Amazônia, cita Glycon de Paiva ao observar que “a China com todos os seus 800 milhões de habitantes está repleta de espaços vazios que cobrem 90% de seus territórios e que a ocupação da Amazônia não se fará ou não se deixará de fazer em função de um crescimento populacional de 1,5% ou de 3% ao ano, mas em função da criação de pólos econômicos... e que, para a criação desses pólos, o fator escasso não é a mão-de-obra... e sim o capital”.

 

Pa resumir o assunto em poucas palavras, bastaria citar a frase do relatório Lester-Pearson: “Nenhuma criança deveria nascer indesejada”.

 

Ao tratar das relações econômicas com o exterior, mostra-se, no Capítulo VI, que o aumento do endividamento do Brasil para com o estrangeiro, apesar de vultoso, tem sido proporcionalmente menor do que o incremento das exportações, setor que tem dado a maior contribuição para o chamado milagre brasileiro. O Prof. Delfim Neto, ao deixar o ministério (onde Deus e o presidente o conservem por muito tempo), terá feito jus, além do mais, à grã-cruz da ordem dos grandes exportadores, conferindo-se a mesma à industria nacional no grau de comendador.

 

Só não se explica bem por que razão o governo não revogou, até agora, a lei do similar nacional, como o propôs a benemérita Confederação das Indústrias, substituindo-a por uma taxa de proteção de 15%. Quem tem capacidade para exportar não precisa da barreira protecionista contra a importação.

 

No tocante ao controle de preços atualmente praticado pelo governo, Simonsen, conquanto não o reprove de modo geral, adverte que a repressão dos preços, extramercado, tem três sérios inconvenientes: um, o mais perigo, o de ser, em regime de inflação, uma arma capaz de levar qualquer empresa à falência; outro, de “tornar os lucros função crescente dos desperdícios”; e, terceiro, de desestimular os investimentos destinados a reduzir os custos de produção.  

 

Apreciando a situação da rede bancária, observa ainda o autor que o resultado das fusões e aquisições de bancos tem sido o de uma “redução apreciável do número de bancos, mas uma queda pouco expressiva do número de agências”. O governo, que intervém em tantos setores, poderia forçar a redução do número de agências nos casos de fusão e aquisição. A esse respeito, o Prof, Bulhões tem observado com vasta razão que a compra de um banco por outro não é medida saneadora, porque importa em novos encargos para o sistema bancário, e que a mediada certa é a fusão sem compra alguma e com redução do número de agências comuns. Alerta o Banco Central...

 

O último capítulo do 2002 trata do “Esforço educacional”, assunto em que o presidente do Mobral é mestre por dever de ofício.

 

E para os que gostam de matemática, há alguns excelentes “Apêndices”.

 

Por onde se vê que o título do livro não está certo. O certo seria, por imodesto que fosse, Lições sobre problemas econômicos da atualidade, e como tal, de leitura obrigatória para todos os governantes, incluindo nessa categoria, talvez por exagero, deputados e senadores.

 

Imperativa seria também a leitura das Lições para duas espécies de gente: os alunos da Escola Superior de Guerra e as escolas de pós-graduação.

 

Sem falar em todos os brasileiros que se interessam pela sorte de seu país. .

 

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u*Eugênio Gudin Filho (Rio de Janeiro, 12 de julho de 1886 - Rio de Janeiro, 24 de outubro de 1986) foi um economista brasileiro, ministro da Fazenda entre setembro de 1954 e abril de 1955, durante o governo de Café Filho.

 

Formado em Engenharia Civil em 1905 pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro, passou a interessar-se por Economia na década de 1920. Entre 1924 e 1926, publicou seus primeiros artigos sobre Economia em O Jornal, do Rio de Janeiro.

 

Em 1944, o então ministro da Educação, Gustavo Capanema, designou Gudin para redigir o Projeto de Lei que institucionalizou o curso de Economia no Brasil. Nesse mesmo ano, foi escolhido delegado brasileiro na Conferência Monetária Internacional, em Bretton Woods, nos Estados Unidos, que decidiu pela criação do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (Bird)

 

Durante os sete meses em que foi ministro da Fazenda (1954-1955), promoveu uma política de estabilização econômica baseada no corte das despesas públicas e na contenção da expansão monetária e do crédito, o que provocou a crise de setores da indústria. Sua passagem pela pasta foi marcada, ainda, pelo decreto da Instrução 113, da Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc), que facilitava os investimentos estrangeiros no país, e que seria largamente utilizada no governo de Juscelino Kubitschek. Foi por determinação sua também que o imposto de renda sobre os salários passou a ser descontado na fonte.

 

 

Ricardo Bergamini
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