Revista Conjuntura Econômico - Vol. 67 n° 02 FEVEREIRO 2013

Dom, 10 de Março de 2013
Seção:
Categoria: Ricardo Bergamini

Fundacao-Getulio-Vargas

 

*Fernando de Holanda Barbosa

 

Hábitos e vícios da política econômica brasileira

 

O ser humano, em qualquer lugar do mundo, age sempre em seu próprio interesse. Esse é o elo comum que independe da etnia, sexo, geografia, religião, cultura e sistemas políticos. James M. Buchanan — Prêmio Nobel de Economia de 1986, que morreu aos 93 anos em 9 de janeiro de 2013 — criou, juntamente com Gordon Tullock, uma área de especialização em economia denominada teoria da escolha pública. Essa área procura compreender os mecanismos de escolhas que não passam pelo mercado, como é o caso, por exemplo, das escolhas feitas pelos políticos e pelos administradores públicos. Esses agentes, como o resto dos mortais, segundo Buchanan e Tullock, não têm como objetivo o interesse público, mas sim o próprio interesse.

 

Os escândalos políticos dos últimos tempos em nosso país, as notícias de uso indevido do dinheiro público nos três poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, nas três esferas, União, estados e municípios, a nomeação de parentes, amantes e afilhados para cargos públicos e/ou de empresas estatais são fatos que não rejeitam a hipótese dos dois economistas. A grande questão de engenharia social é como construir instituições que impeçam o ser humano, vestido de político e/ou administrador público, de se tornar um predador social.

 

No setor privado, o empresário pode se tornar um predador social ao poluir o meio ambiente, ao cobrar pelo seu produto um preço que embute o poder de mercado, ao não atender às especificações técnicas que seu produto deve satisfazer, ao usar de informação privilegiada para se beneficiar, ao não informar seu cliente do destino que está dando aos recursos aplicados pelo mesmo na instituição financeira. A forma de combater o predador é construindo instituições de regulação que tenham como objetivo reduzir esse problema. Aqui, também, pode-se dizer que o regulador não necessariamente vai agir no interesse público, mas sim no seu próprio interesse. Como desenhar essas instituições para que elas cumpram seus objetivos? Essa não é uma tarefa simples. Mas uma condição necessária é tirá-las das mãos dos políticos, tornando as agências independentes do Poder Executivo, e indicando para a diretoria das mesmas pessoas ilibadas, com currículo e tradição no ramo. A história recente brasileira tem mostrado que nem sempre esse é o caso.

 

Nos últimos meses a imprensa tem noticiado a contabilidade criativa da equipe econômica do governo da presidente Dilma. Um jogo de contas acertou o valor do superávit primário para que se cumprisse a meta previamente fixada pelo governo. Na área de índice de preços alguns prefeitos e governadores foram contatados por membros da equipe econômica para postergar reajustes de tarifas de serviços públicos, com o objetivo de reduzir o índice da inflação no início do ano. A novela do reajuste dos preços dos derivados do petróleo prossegue: a Petrobras arca com o prejuízo e por tabela o etanol se torna economicamente inviável. O governo mata dois coelhos com uma só cajadada.

 

O hábito de o governo maquiar números fiscais e controlar preços no Brasil tem uma longa tradição. Os preços dos derivados do petróleo sempre foram políticos. Por exemplo, na época do ministro Simonsen (governo Geisel) existia a conta petróleo. Ele uma vez disse-me que tinha duas pessoas que entendiam essa conta, ele mesmo e um funcionário da Petrobras. No caso de maquiagem fiscal, usou-se até o expediente de mudar a data do pagamento do funcionalismo público do Poder Executivo para o mês seguinte com o intuito de se reduzir a folha de pagamento num determinado ano (pelo critério de caixa).

 

Como resolver esse imbróglio? O hábito no Brasil tornou-se um vício. Como acabar com o vício? Retirando a droga. Portanto, o desafio é construir instituições que não permitam o uso de contabilidade criativa pela administração pública brasileira. Caso contrário, a história se repetirá com novos personagens.

 

*Fernando de Holanda Barbosa é professor da Escola de Pós-Graduação em Economia da FGV.

 

 

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