"POVO QUE NÃO RESPEITA SEU PASSADO E SUA HISTÓRIA NÃO É DIGNO DE FUTURO"

 

Depoimentos sobre o movimento cívico - militar de 31 de março de 1964

 

Esta página foi aberta para depoimentos de todos os participantes, civis e militares, do movimento cívico-militar de 31 de março de 1964, com o objetivo do resgate da verdade histórica.

 

Participem!!!!!!!!

 

"POVO QUE NÃO RESPEITA SEU PASSADO E SUA HISTÓRIA NÃO É DIGNO DE FUTURO"

 

"Qualquer semelhança com o maldito momento atual da vida brasileira, não é mera coincidência"

 

Depoimento do Coronel do Exército da reserva José Américo Gonçalves Barros.

 

 

Prezado Sr Ricardo Bergamini:

 

Tenho acessado o site www.rberga.com.br, e animei-me a prestar o meu depoimento sobre a Revolução de 31 de Março de 1964, como protagonista, quando tinha a honra de servir no Sampaio! Aceite meus cumprimentos, pela iniciativa, já consolidada, de divulgar e restabelecer a verdade histórica sobre esse movimento que nos preservou como Nação livre, democrática e soberana.

 

Cordialmente, Cel Américo

 

A REVOLUÇÃO QUE EU VI

 

Na época da revolução eu servia no Glorioso Regimento Sampaio, que liderado por capitães, à revelia dos Oficiais Superiores, desobedeceu as ordens do Escalão Superior, e em vez de oferecer resistência às tropas de Minas, comandadas pelo Gen. Murici, bandeou-se para o lado das tropas de Minas e voltou ao Rio, já incorporado, pronto para combater o governo golpista e comunista que fugiu. Eu era Capitão.

 

Creio que naqueles momentos decisivos, nosso destino estava realmente em jogo! Segundo depoimento do Gen. Murici, que vinha na vanguarda e estabeleceu contato conosco, se o Sampaio entrasse em posição contra os regimentos de Minas, tudo poderia acontecer, pois eles teriam que se desdobrar para forçar a passagem rumo ao Rio, onde ele tinha urgência em chegar, pois havia dúvida quanto à verdadeira situação em São Paulo. Na época, não se deu o verdadeiro valor ao papel que o Sampaio desempenhou, por desconhecimento do que realmente aconteceu, antes e durante a ida em direção a Minas...

 

Eu estava no Sampaio havia menos de um mês, mas fui citado como confiável, por um companheiro que já servia no Sampaio. Era o meu conterrâneo, o então Cap. Lustosa. Daí em diante, passei a tomar conhecimento da evolução dos acontecimentos; e fiquei sabendo que o Sampaio receberia uma das duas seguintes missões:

 

1- Ficar de Prontidão, guarnecendo a Vila;

 

2- Seguir em direção a Minas .

 

Na Segunda hipótese, nós sairíamos normalmente, como se fossemos cumprir a missão, mas já determinados a aderir e nos incorporar às tropas de Minas. Tudo definido entre os capitães e alguns tenentes mais antigos.

 

Pouco antes da saída, o Cel Raimundo, Cmt do Sampaio, começou a pressentir que alguma coisa não estava sob seu controle. Felizmente, antes da partida, o velho resolveu NOS APOIAR, e reuniu os Oficiais para dizer que "estava conosco". Foi bom; pois ele realmente aderiu; e desempenhou bem o seu papel de Cmt.

 

Logo que saímos do Quartel, soubemos que repórteres do Jornal "Última Hora" estavam nos seguindo. E que sabiam exatamente qual a missão do Sampaio, inclusive onde deveríamos nos posicionar, para fazer face às tropas de Minas. E o Cmt sabia que eles tinham autorização da DI para nos seguirem. Por isso deixou que eles nos acompanhassem, inclusive fazendo perguntas. Até quando chegamos na região onde deveríamos nos posicionar, onde realmente paramos e o Cel então disse para eles: "Bom, meus senhores, até aqui os Srs. puderam vir; mas a partir de agora, não podem mais permanecer neste local que poderá tornar-se uma Área de Operações." E esperou que eles se afastassem bastante para dar a ordem de retomada do deslocamento; tendo o Cap. Zamith ido à frente, num jeep, estabelecer o contato e avisar às tropas de Minas, que o Sampaio vinha chegando, mas era para aderir, e não para combater!

 

Aí começaram os problemas na coluna, constituindo um GT, com base no Sampaio, apoiado por um GO do Regimento Floriano; além de outros apoios, como uma Cia Com e Elm de Int. Ao constatarem que o Sampaio não se estabelecera na Região onde deveria, mas prosseguia, uma parte do GO manobrou, liderada por Oficiais Superiores (menos o Cmt, que ficou, sem saber o que fazer) Restou só uma Bia completa, mais alguns Elm restantes do Go, que assim se desintegrou, por falta de uma liderança que o levasse inteiro, para um lado, ou para o outro.

 

Assim, o encontro que se esperava fosse tranqüilo, teve seus momentos de suspense, não pelo Sampaio, mas pelos apoios. Quando soube que só restara uma Bia, o Gen. Murici falou:- "Cerca, que preciso dessa Bateria na nossa Força." Foi a minha 5ª Cia Fzo que cercou a Bia já embarcada; e eu convidei o Cap. Cmt a desembarcar com sua Sub Unidade, para ouvir o Gen. Murici. Quando terminou o desembarque eu, por precaução, posicionei a minha Cia, deitada, em volta de todos os que participavam ou assistiam aqueles momentos decisivos. O Gen. Murici fez a sua explanação sobre o destino do Brasil, e terminou com esta frase de efeito: "E agora, quem estiver com o Comunismo, para a esquerda; e quem estiver com o Brasil, para a direita!" Ante um silêncio constrangedor, ouviu-se uma voz de comando: "Atenção a Bateria! Quem falou, não foi o Gen. Murici! Foi o Espírito Santo, que baixou nele! Comigo!" E toda a Bateria, em fila indiana, seguiu atrás daquele líder nato: O Sargento Josué!

 

Conseguida a adesão da Bia, o Gen. Murici, já mais aliviado, voltou-se para o Cmt do que fora um GO e prosseguiu uma conversa que eu percebi tivera um início pouco animador, pois ele não conseguira convencer o Ten-Cel a assumir o comando daquela Bia de sua Unidade: "Mas, Fulano, eu te conheço! Nós já servimos juntos. Entre a lealdade ao seu Cmt , e a lealdade ao Brasil, com quem você fica? E o Ten-Cel disse: "Gen., eu não quero decidir!" E, o Gen. Disse: "Então, eu vou te ajudar: Você está preso!" O Ten-Cel tomou a posição de sentido e disse: "Obrigado, General!" O Gen. Murici então indicou um jeep para o Ten-Cel ficar aguardando, preso, até a chegada no Rio. Como o próprio Gen. falou, ele foi indeciso, numa hora em que foi preciso um Sargento assumir o papel de verdadeiro líder daquela situação decisiva.

 

Terminado o almoço, já em clima de confraternização, a coluna reorganizou-se, agora com o Sampaio em 4º escalão, e os três regimentos de Minas na frente. Lembro-me que perguntei porque o Sampaio não voltava na frente. Revolução é bom porque a gente dá opinião onde não é chamado. E ninguém pergunta o que a gente está fazendo, onde os acontecimentos se desenrolam!

 

Já estávamos nos deslocando por algum tempo, quando toda a coluna parou. Após menos de uma hora, o movimento foi retomado. Depois soubemos que o motivo foi o encontro inesperado e em condições difíceis de explicar, com uma tropa, que ficamos sabendo ser o 3º R I, com reforços, e que à frente dela estaria o Cmt da I D/1. Também chegou até nós o diálogo que teria se travado entre o Gen. Murici e o Cmt daquela tropa: Gen. Murici: "Eu estou vindo com quatro GT, à base do 10º, do 11 e do 12 R I, além do Sampaio, que aderiu. Você tem 15 min para abrir passagem, pois eu tenho pressa em chegar ao Rio!". Consta que o Cmt da I D/1 teria concordado, pedindo apenas 30 min em vez de 15. O certo é que pouco tempo depois, nós passávamos por uma tropa estacionada e deitada nos dois lados da estrada e prosseguíamos viagem, sem mais contratempos, até o Rio!

 

Sem contratempos, mas com a preocupação aumentada, pois não sabíamos o que íamos encontrar na volta! Haveria reação de alguma tropa ainda leal ao governo que desmoronava? A Situação estava tão confusa, que nem os Chefes sabiam, com segurança, o que estava acontecendo...

 

Como estariam nossas famílias, que havíamos deixado para trás, numa situação; e agora retornávamos, sem saber o que teria ocorrido, enquanto estivemos ausentes?

 

Por mais que os nossos desafetos procurem denegrir o papel das FFAA na deflagração e condução do movimento de 64, nós militares continuamos convictos de que foi uma intervenção necessária, e que preservou o nosso destino, como nação livre, soberana e democrática! E se tudo não resolvemos, pelo menos evitamos o mal maior, cujo desfecho só sabe Deus o que seria...

 

Cinco anos depois, eu comandava a 3ª Cia Fron, em Porto Velho, quando recebi a visita do Chefe do Estado-Maior do Exército, Gen. Ex. Murici! Durante o almoço, na saudação que lhe fiz, relembrei todos esses fatos, perante toda sua comitiva, alem do Gen. Rodrigo Octávio, então Cmt Militar da Amazônia. Ele ficou emocionado! Levantou-se e confirmou tudo o que eu havia recordado, inclusive o nome do Sgt Josué!

 

Trecho do livro: Memórias de um revolucionário - Do Gen. Ex. Olympio Mourão Filho Cmt da 4ª R M , em 31 de Março de 1964:

 

"Do mesmo modo é de meu dever honrar aqui o glorioso Regimento Sampaio que aderiu à causa quando tudo ainda era obscuro. Esta Unidade saiu do Rio para nos combater e sua adesão à causa não foi num bom momento; eles passaram-se quando tudo parecia indicar nossa derrota."

 

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