A Reforma na Alemanha

Ricardo Bergamini

 

O ambiente na Alemanha – mais do que em qualquer outra nação – era especialmente favorável, em começos do século XVI, a um movimento reformista. Nesta época é que aparece Lutero.

Martinho Lutero (1483-1546), de família humilde, nasceu em Eisleben (Saxônia). Agostiniano e professor de teologia na Universidade de Wittemberg, era um homem sensível e inquieto, constantemente perseguido pela idéia do pecado. Só conseguiu a paz de espírito quando, pela leitura de Santo Agostinho, convenceu-se de que a chave da salvação era a fé, a confiança em Cristo. Em 1517, surgiu a “questão das indulgências”: Lutero sublevou-se contra esse sistema de perdoar pecados mediante pagamento, o que considerava um torpe comércio. Chegou mesmo a atacar aspectos do dogma e do ritual da Igreja, o que levou o Papa Leão X a condenar-lhe os atos e as doutrinas, exigindo sua retratação. Lutero, porém, queimou em praça pública a bula condenatória (20 de dezembro de 1520). O Papa, então, excomungou-o. Começava a Reforma e a luta entre reformistas e católicos.

Carlos V, que era nessa ocasião o imperador do Sacro Império Romano Germânico, intimou Lutero a comparecer perante a Dieta de Worms. Nela, Lutero não se retratou; pelo contrário, reafirmou suas idéias. A Dieta condenou-o como herege, mas Lutero, protegido por um salvo-conduto do príncipe-eleitor da Saxônia, conseguiu refugiar-se no castelo de Wartburg, onde permaneceu oculto até a morte de Leão X. No silencioso refúgio, Lutero traduziu a Bíblia ao alemão e redigiu parte dos seus escritos panfletários. A tradução, escrita em alemão corrente, era clara e acessível a todos; foi o primeiro modelo do alemão moderno.

As doutrinas de Lutero propagaram-se com notável rapidez e provocaram reivindicações (libertação dos servos, igualdade social) e revoltas de camponeses e cavaleiros, que foram sangrentamente reprimidas pelos príncipes. Mas estes sim, apossaram-se dos bens eclesiásticos (secularização).

Carlos V, no desejo de restabelecer a unidade cristã nos seus domínios, convocou nova Dieta em Augsburgo (1530) e pediu a Lutero que apresentasse, por escrito, sua doutrina, a fim de ser tentado um acordo com os católicos. Melânchton, grande humanista, de caráter moderado, foi designado por Lutero para a redação da profissão de fé luterana. Este credo luterano (28 artigos) é a chamada “Confissão de Augsburgo”. Seus pontos fundamentais eram: único meio de salvação: a fé; única fonte de fé: a Bíblia; interpretação da Bíblia: livre exame por todos os fiéis.

Além disso: não reconhecimento da autoridade papal, necessidade de suprimir as imagens e a condição eclesiástica, não validez da missa e do culto aos santos, e alteração de diversos outros aspectos do dogma e do ritual.

Tendo ficado evidenciada a impossibilidade de qualquer acordo, decidiu-se recorrer à luta armada. Os príncipes católicos renovaram a aceitação das condenações de Worms. Os príncipes protestantes, para defender-se, formaram a Liga de Smalcalda (1531). Os coligados somente foram atacados por Carlos V em 1546, logo após a morte de Lutero.

Depois de uma série de cruentas guerras, celebrou-se a paz de Augsburgo (1555), que concedeu aos príncipes a liberdade de culto e reconheceu a propriedade definitiva das terras secularizadas, mas criou o estranho princípio de que os súditos teriam de seguir a religião do seu príncipe (sob pena de expulsão e perda dos bens).

O luteranismo foi-se estendendo rapidamente, da Alemanha à Suécia, Noruega e Dinamarca. Todavia, aceita a idéia da livre interpretação, logo surgiram diversas correntes reformistas, não só divergentes, mas às vezes até inimigas.

 

O autor é Professor de Economia

 

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