JUSTIÇA SUMÁRIA

*Raymundo Negrão Torres

Em um dos morros cariocas – uma das muitas "zonas liberadas" do crime organizado no Brasil – reuniu-se um "Tribunal de Exceção" presidido por um dos bandidos que as governam. O réu, um jornalista que vinha sigilosamente documentando a ação do tráfico de drogas em um dos tais bailes "funk" da periferia da outrora Cidade Maravilhosa, foi condenado e executado de maneira bárbara após ser torturado nos primeiros dias de junho de 2002. O fato faz lembrar a ação de outros "tribunais" instituídos por criminosos de outro feitio.

O dia oito de outubro de 1968 assinalaria o primeiro aniversário da morte de Ernesto "Ché" Guevara na Bolívia e um grupo de bandidos políticos resolveu comemorá-lo com um justiçamento. E um outro "tribunal", este dito "revolucionário", foi montado sob a presidência do ex-sargento do Exército Onofre Pinto e mais dois membros da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). O réu, julgado à revelia e condenado, foi o capitão do Exército americano Charles Rodney Chandler que, depois de cumprir missão no Vietname, viera com a esposa e três filhos menores fazer um curso na Escola de Sociologia e Política da Fundação Álvares Penteado, em São Paulo. A acusação era que o capitão seria um agente disfarçado da CIA.

No dia 10 de maio de 1970, em meio à mata do vale da Ribeira, onde outro grupo de criminosos pretendia montar uma "zona liberada de guerrilha", um outro "tribunal" reuniu-se. O tenente da Polícia Militar de São Paulo, Alberto Mendes Júnior que se oferecera como refém em troca da vida de seus homens, tornara-se um estorvo para os bandidos em sua tentativa de furar o cerco policial-militar. Resolveram matá-lo e como o barulho de um tiro poderia denunciá-los, o fizeram a coronhadas que esfacelaram a cabeça do condenado. O presidente do "tribunal", também promotor, juiz e comandante do pelotão de execução, chamava-se Carlos Lamarca.

No começo do ano de 1971 – um dos chamados "anos de chumbo" – um importante membro de uma organização comuno-terrorista - que acabara de regressar de Cuba onde fizera um curso de guerrilha - foi acusado de "vacilação e recuo". Novamente, um "tribunal de exceção" foi convocado e o réu, sem ser ouvido e sem direito à defesa, foi condenado. No dia 23 de março de 1971, na rua Caçapava, em São Paulo, a sentença foi cumprida e Márcio Leite Toledo - que tinha sido transformado em um fictício Sérgio Moura Barbosa - foi morto a tiros por seus comparsas. Um deles era Yuri Xavier Pereira, filho de Iara Xavier Pereira, uma das mais ativas integrantes da famosa Comissão dos Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos.

Hoje, muitos dos "juizes" desses "tribunais" estão mortos, mas suas famílias receberam, as custas do povo brasileiro, polpudas indenizações e continuam recebendo pensões pelos seus feitos. Alguns viraram nome de rua e foram colocados no panteão da reverência nacional durante o governo de FHC.

Mais algum tempo e a continuar como vamos, Elias Maluco e seus sequazes também serão nomes de ruas ou de estradas nacionais e merecerão reportagens de TV feitas pelos "cacos barcelos" de então.

O autor é General reformado. Este endereço de e-mail está protegido contra spambots. Você deve habilitar o JavaScript para visualizá-lo.

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